quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Alunos Orientais


Quando freqüentava o Grupo Escolar, tive colegas niseis. Não foi difícil torná-los amigos. Discretos, tímidos e reservados não se envolviam nas bagunças que inventávamos, mas estudantes sérios eram companheiros para estudos e pesquisas e jamais recusavam a solicitação dessa ajuda. Mais tarde, já no Colegial - nome que se dava ao que hoje chamamos de Ensino Médio - outros amigos apareceram, sempre com procedimentos similares. Eram alunos que jamais causavam problemas disciplinares.

A situação mostrou-se similar quando me fiz professor. Com o passar do tempo e a chegada dos sanseis, já mais aculturados e distantes da formação dentro de uma tradicional família oriental, percebia-se um ou outro um pouco mais ousado, mas em geral ainda se mostravam distantes de procedimentos indisciplinados, rotineiros nos alunos brasileiros, mesmo quando filho de italianos, espanhóis, portugueses e outras nacionalidades.

Não creio que essa experiência seja inédita, ao contrário penso que qualquer outro professor que viveu em uma cidade como São Paulo marcada pela presença de comunidades orientais, deve ter vivido experiência similar. Alunos, filhos de famílias orientais, mesmo em uma segunda geração, não costumam ser indisciplinado e extremamente dedicado aos estudos, não surpreendem de conquistarem vagas nos vestibulares mais difíceis. Essa proporção não é desmentida por estatísticas recentes: alunos oriundos de famílias orientais correspondem a menos de um por cento dos vestibulandos inscritos, mas ficam com mais de dez por cento das vagas mais disputadas. A boa disciplina salvo exceções de poucos, corresponde também a bom desempenho escolar. Qual a razão para isso?

A resposta não é difícil. É sabido que alunos mais aplicados, são os que maior êxito conquistam. Mas, a questão essencial é saber por que alunos de famílias orientais são mais disciplinados que a média dos alunos matriculados nas escolas brasileiras?

Ainda uma vez a resposta não é complicada e pode ser resumida a duas palavras: "Estrutura familiar". A criança e o adolescente filho (ou neto) de japoneses, chineses, coreanos ou ainda outras etnias da Ásia se comportam melhor em sala de aula não porque são menos agitados que filhos de brasileiros, nem porque são mais inteligentes, mas por que provém de famílias onde o respeito é coisa séria e onde os pais, desde o berço, conseguem de forma maravilhosa equilibrar o aplauso pelo sucesso que estimula e anima, com normas procedimentais rígidas, mas não necessariamente severas, e persistentes ainda que compreensíveis. Além disso, são lares onde o diálogo é ação permanente e o respeito pelo idoso e por seus ensinamentos não é condescendência dos jovens, mas valor moral que não se ousa questionar.

Seria possível pensar que essa estrutura familiar que se reflete na disciplina escolar e que influi no sucesso acadêmico é produto de uma cultura geralmente xintoísta ou mesmo budista e que, assim, seria diferente da brasileira. A argumentação convence, mas se sabemos que certas linhas de procedimento funcionam, e funcionam bem, em outras culturas por que não assumi-las com nossos filhos? Preceitos morais xintoístas e budistas não constituem bagagem hereditária e, portanto, podem ser assumidos por qualquer um, sem que isto implique e se deixar de ser Cristão ou Ateu. Não há qualquer razão para que a família brasileira ao sonhar com a felicidade dos filhos, não possa pensar nesse admirável equilíbrio entre estímulo e respeito a regras que tão bem fazem para famílias orientais.

Não se pretende com essas idéias afirmar que não existem famílias brasileiras admiravelmente bem estruturadas, que sabem equilibrar estímulo com firmeza e dessa forma educarem seus filhos para serem disciplinados e aplicados, sem que isso deixe de valorizar a ousadia de inventar, descobrir, experimentar. Que saibam mostrar de muitas maneiras e em todos os momentos que o grupo familiar é mais sólido que a eventualidade transitória dos muitos grupos sociais que se descobre. Essas famílias, entretanto, raramente constituem a maioria em uma comunidade e, por essa razão, o problema da indisciplina preocupa muito. Seria realmente muito bom se o que é exceção entre as famílias brasileiras se transformasse em regra e o que é comum entre a maior parte das famílias orientais fosse também comum entre as famílias brasileiras.

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