terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Margarida

-          Tudo bem, senhor Delegado. Se é necessário eu registro o tal de Boletim de Ocorrências. Presto todos os depoimentos necessários e, ainda que isso implica em ter que perder aulas, voltarei quantas vezes for necessário. Mas, Senhor Delegado, por favor veja se consegue prender o ladrão...

-          Faremos o possível, Dona. Mas, a senhora há de convir que não é nada fácil. Vivemos em uma cidade violenta e roubos como o que a senhora sofreu são extremamente comuns. A maior parte nem dá queixa...

-          Também eu, Senhor Delegado, não daria queixa. Ocorre, entretanto, que necessito recuperar o que foi roubado. É essencial que o Senhor e que toda a Polícia possa me ajudar. Eu estou implorando doutor...

-          Tudo bem... tudo bem. Vamos então colher seu depoimento. Nome completo, outros dados pessoais e, com objetividade, conte como tudo aconteceu...

-          Meu nome é Margarida Pontes. Sou professora da Escola estadual Waldomiro Contreras. Tenho 34 anos, sou casada e aqui está para o senhor conferir todos os meus documentos...

-          Bem, professora Margarida. Vejo que, pelo menos sobrarão seus documentos. Menos mal. Muitas das pessoas que aqui me procuram são roubadas em dinheiro, talão de cheque, cartão bancário, documentos e, ainda erguem a mãos para os céus quando são poupadas em sua vida...

-          Acontece doutor que minha perda é muito grande. Se fossem os documentos, ficaria chateada, mas iria providenciar uma segunda via. Não seria a primeira vez. Mas, minha perda é mesmo muito importante. Será que posso ter esperanças?

-          Não sei! Não sei! Mas, vamos lá. Conte toda a ocorrência. A senhora é professora e, portanto, deve ser muito boa em relatar e sintetizar!

-           Tudo começou quando eu ia saindo do ônibus após as aulas. Eram mais ou menos seis e meia da tarde, a noite começava a cair. No momento em que me vi no ponto do ônibus, percebi que um jovem claro, razoavelmente bem vestido e com um ar simpático caminhava em minha direção. Ao chegar perto, olhou para os lados depressa, e avançando para mim, arrancou-me a sacola e saiu correndo. Eu gritei, xinguei, chorei e até pensei em correr atrás, mas rápido como a ventania, o bandido saltou a mureta e misturou-se com as pessoas do outro lado da rua. Fiquei desesperada e chorei, chorei muito. Várias pessoas me ajudaram e uma policial, muito gentil, colocou-me no carro e trouxe-me aqui. Acho que foi só isso, doutor. Será que a Polícia recupera minha sacola? Ela é muito importante para mim!

-          Como já disse, dona Margarida, acho que não é nada fácil. Mas diga lá. O que havia na sacola? Dinheiro? Sapato? Jóias? Não tenho o tempo todo e preciso de objetividade. O que havia assim tão importante nessa perda, professora?

-          Nem dinheiro, nem jóias, nem sapatos, senhor delegado. Na sacola estavam meus livros e as provas de meus alunos. Não posso ficar sem isso. Já pensou no desapontamento deles?  Se o senhor pegar o ladrão, não bata, não judie e se as provas e os livros forem devolvidos garanto que posso até dar um dinheirinho e se o coitado do ladrão precisar, darei até alguns conselhos. Sabe como é, seu Delegado. Eu sou uma professora...

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